30.11.07

da modernidade

todo mundo é muito moderno. pelo menos todo o mundo ao meu redor. e o mundo que cruza o meu caminho. cruza, olha e vai embora. às vezes tropeça, finge que nem doeu, e continua andando. o moderno não se abala. não vê o mundo. é ele, ali, no momento, com ele próprio. às vezes acha um outro alguém, ali, para passar um momento, assim, com ele próprio. o momento passa. a pessoa passa. e fica, assim, ali, ele próprio no momento dele.
casal moderno transa e dorme abraçadinho. amanhã o outro alguém e ele próprio acordam e vai cada um pro seu lado. na próxima balada eles próprios se cruzam. pq, sim, os moderno se cruzam por aí. no sentido físico e bíblico. moderno não planeja. não marca. moderno não tem antecedência. é ali, assim, no momento. independente futebol clube. moderno não fala em amanhã. e, amanhã, não se falam. cada um por si e deus pra todos.
quando ele próprio cruza com o outro alguém a educação pede - e modernos são educados - uma atenção ali, assim, naquele momento. como se nada tivesse acontecido, fosse acontecer, pudesse acontecer ou estivesse acontecendo. o que o ele próprio e o outro alguém tiveram, ali, naquele outro momento, não é da conta de ninguém. nem dele próprio, nem do outro alguém. passou. este é um país livre. "oi? tudo bem?" rola até um: "como vai seu gato?". tudo muito moderno.
ele próprio sai andando. e o outro alguém acha que não quer viver mais num mundo onde dormir abraçadinho não signifique nada.

21.11.07

do cataclisma

-mas vc vai assim?
-?
- tá frio. sua roupa tá amassada. vc nem tomou café. e vai chover. e tá trânsito. e…
-…e os quatro cavaleiros do apocalipse vão voltar. e o brasil não vai se classificar pra copa. e…

do abstrato

- o que é isso?
- nada.
- ah, vai…
- tá, é uma fivela laranja
- não, O-QUE-É-ISSO??
- nada!!
- como nada?
- fora ser uma fivela laranja, não é nada, não.
- peraí, 'xeuver… hum… parece um sol, com umas nuvens… e…
- não, não é nada.
- peraí… como nada? não, olha aqui: aqui parece um arco-íris.
- não, não parece. é só uma forma.
- olha, bem aqui
- pra este grande nada laranja na minha cabeça?
- é… essa forma lembra alguma coisa…
- uma fivela?
- não, isso aqui parece com alguma coisa… ou vc anda com um grande nada laranja na cabeça?
- eu ando
- pq? se é nada?
- pq é laranja.

13.11.07

da organização

ao lado dos bebedouros, das bandejas de cafés e outras desculpas para dar um tempo do trabalho e uma andadinha no escritório, começou a surgir um "novo conceito em design": os lixos temáticos.
o lixo está posicionado ao lado do bule. logo, vc não vai lá jogar papel. vc não vai lá jogar qualquer outra coisa que seja que não um copo plástico. porque alguém faria isso, afinal, não? ali é o lixo do café. mas, para não discriminar os que só bebem água, por exemplo, estes novos lixos têm três buracos: dois grandes - para copos de água -, um pequeno - para os de café -, e um bem menor que, acho eu, serve para bitucas. assim, ninguém joga mais nada no lixo. as coisas são colocadas cuidadosamente em seus devidos lugares.
há também os que são um lixo único. uma tripa vertical de metal com o diâmetro do objeto a ser jogado. se assemelham muito no que poderia ser um porta-guarda-chuva para um guarda-chuva só. e vem neles escrito: "água" e "café". por favor, não confuda. não me venha aqui jogar o lixo errado, hein!

.

o que será q acontece com os copos depois de recolhidos? já estão todos separadinhos. isso deve ter alguma utilidade. será que eles são reutilizados??? lavô-tá-novo?? ecologia hardcore??
plástico, vidro e papel, há um sentido em separar. água, café e chá, ainda não descobri.

10.11.07

do controle

depois de tentar guiar um carro automático, percebi que tenho com ele o mesmo problema que com cavalos.
não consigo andar à cavalo pq tem ali duas mentes pensantes. uma quer ir e a outra não quer, por exempo. rá! e ai? o que acontece? ou você cai do cavalo - pq ele sai andando - ou você faz o cavalo andar, sendo que ele tá ali, na dele, sussa, numa relax, numa tranqüila, numa boa, e não quer ir dar um passeio. eu ia odiar que me fizessem sair andando com uma cutucada no estômago quando eu não quero ir... morro de dó de andar à cavalo, na verdade. uma tirana sem coração.

e não consigo guiar um carro automático pq, apesar de parecer tão mais fácil, não dá para controlá-lo por completo. você resolveu que ali era melhor mudar de marcha, ou quer dar uma arrancada, ou, sei lá, você resolveu que vc tá indo com o seu carro, pelo seu caminho e no seu rítmo e não quer dividir estas decisões com outras pessoas. ou pior, com uma máquina.

quem que manda aqui, afinal?

8.11.07

do fã

-"você existe mesmo! eu nunca tinha visto alguém assim tão de perto!"
foi a única coisa - leve, irônica e metida a engraçadinha - que eu consegui dizer na hora para aliviar meu espanto: um conhecido, que parecia legal, tinha acabado de me dizer que achava o capitão nascimento o máximo. acompanhado de: o que teria demais dar umas batidinhas em alguém para fazer ele falar??

-mas não é uma batidinha, um tapinha nas costas, tipo: "fala aê, amigão", é porrada feia, meu
-ah, mas se não colabora, meu, é o q precisa fazer...

-morreu? pra que se preocupar com alguém que eu nem sei quem é? é guerra. casualtys of war, sabe? é foda, mas alguém vai ter q sofrer.
-ah, contanto que não seja vc, nem ninguém que vc conheça vc tá achando tudo ok, né?

eu tava chocada. como explicar pra alguém que ética é ética, que o certo é certo e que o errado é errado? matar pessoas, errado. polícia matar pessoas, errado. bandido matar pessoas, errado. er-ra-do. crime pra qualquer um dos dois lados, errado. tá tudo errado, tudo errado!

-e diz aí, vc é anti-bush?
-pq? vc é pró??? meu deus!! eu achei que eles morassem todos no wyoming! vc acha ele legal mesmo? jura??
-não sou só eu, tem um grupo e tal.

ele é vários. são muitos. eles são a maioria, na verdade.
que medo.

da geladeira

na sala de espera tinha uma geladeira. destas pequenas. em que cabe uma garrafa d'água de plástico reutilizada, uns dois iogurtes e uma maçã. que eu acho que é o que deveria ter ali dentro.
ela servia de suporte para um rádio que tocava música clássica e dois potes de bolacha. ela tinha dois imãs grudados também. em geral, eu odeio imã de geladeira. acho cafoninha. e adoro bolacha de chocolate recheada. acho delícia.
mas, nesta geladeira, eu gostei mesmo dos imãs: "a república" do delacroix e uma placa da "route 66". achei uma geladeira libertária. com boas idéias e bons ideais. e que as pessoas querem liberdade de diversas maneiras e em todas as épocas. seja cortando cabeças ou com o vento na cara.

4.11.07

da gata

essa, desde que eu descobri como funcionava a vitrola, sempre foi a música que mais tocava sem parar:

.

"me alimentaram. me acariciaram. me aliciaram. me acostumaram.

o meu mundo era o apartamento
detefon, almofada e trato
todo dia filé mignon ou mesmo um bom filé de gato
me diziam a todo momento:
"fique em casa, não tome vento"
mas é duro ficar na sua, quando à luz da lua
tantos gatos pelas ruas
toda noite saem cantando assim:
"nós gatos já nascemos pobres, porém, já nascemos livres
senhor, senhora, senhoria, felinos, não reconhecerás"

de manhã eu voltei pra casa
fui barrada na portaria
sem filé e sem almofada, por causa da cantoria
mas agora o meu dia-a-dia
é no meio da gataria
pela rua virando lata eu sou mais eu, mais gata
numa louca serenata
que de noite sai cantando assim:
"nós gatos já nascemos pobres, porém, já nascemos livres
senhor, senhora, senhoria, felino, não reconhecerás"

.

isso já devia querer dizer alguma coisa